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Wednesday, June 9, 2010

O Segredo da Múmia (1982)

O SEGREDO DA MÚMIA
Direção: Ivan Cardoso
Brasil, 1982.



Imagine a cena: um criado daqueles bem clichê de filmes B dos anos 50, que canta ópera e mata quem se colocar no caminho do patrão (que, no caso, é um cientista maluco) e uma múmia serial-killer. Agora imagine tudo isso rodeado de seios, bundas e todos os elementos pornochanchadísticos...

Imaginou?

Agora, visualize isso tudo se passando no Rio de Janeiro da década de 50. Melhorou? Então é isso (e mais um pouco) o que se passa em “O Segredo da Múmia” (Idem, Bra, 1982), esse clássico do cinema –sem noção- nacional que foi esquecido e nunca lançado em DVD, sobrando cópias apenas para garimpeiros de podreiras de plantão, o que é uma pena e um verdadeiro desperdício cultural.



Ivan Cardoso criou esse universo mágico citado acima em 1982, com o seu “Segredo da Múmia”, consolidando-se assim como inventor e mestre do “terrir”.

Para quem não sabe o “terrir” é um sub-gênero que surgiu nos anos 80 (oh, época boa!!!) como nada menos que uma bela desculpa para dar risada e ultrapassar o limite do nonsense, tudo com muita mulher gostosa, defeitos especiais e falhas escabrosas no roteiro. Tem coisa mais linda?

Seguindo essa linha “O Segredo da Múmia” é uma obra cheia de momentos unânimes, irreverentes e divertidíssimos. Afinal, uma múmia no Brasil não pode ser menos que isso.



Expedito Vitus é um cientista dotado de uma extrema inteligência, porém ridicularizado pelos seus colegas e pela mídia em geral porque diz ter descoberto o “elixir da vida”. Tudo muda quando ele encontra a famosa múmia “Runamb” no Egito, e a traz para solo tupiniquin, o que é retratado de forma magistral pelos jornais da época e até o famoso “Repórter Esso” fez questão de noticiar o fato!


Vitus virou um superstar. Mas ele vai além, testando o elixir na múmia. Daí para frente não precisa ser um gênio para saber que a múmia vai levantar querendo matar qualquer um que passar na sua frente. Isso seria normal em qualquer filme, mas aqui a coisa é "made in Brasil", o que torna tudo muito mais divertido.

Wilson Grey está simplesmente genial na pele do excêntrico Dr. Expedito Vitus, em uma interpretação repleta de expressões e caretas dignas de um verdadeiro “cientista maluco”, sua voz também merece destaque, parece que ele está falando para dentro de um funil.

A cereja do bolo fica por conta da criadagem do Dr. Vitus. A empregada Regina, interpretada por Regina Casé em uma performance mais bizarra do que qualquer um dos seus atuais programas de TV e o mordomo Igor (Felipe Falcão) que mais parece o “tio Chico” com síndrome de down, e nos faz rir com suas caras e bocas forçadas e, a todo momento, parece que está literalmente se cagando em cena. “Terrir” é isso: não é beirar o rídiculo, é ir além dele.


Regina (magrinha, como nunca) e Igor têm um “caso” e nos propiciam uma cena antológica que escreveu suas letras na história do cinema nacional, se não, ficará para sempre na minha memória, ainda não sei se pelo susto ou pelo valor histórico de tal “atrocidade”.

De repente, no meio do clímax da história, aparece um letreiro em tela preta: “enquanto isso..” são os dizeres que aparecem na tela. Corta. Regina (com cabelos no sovaco) nua e jogada na cama junto com Igor que a lambe inteira, com tamanha vontade que achei que fosse pular para fora da tela. A cena em si é de um realismo imenso, o que comparado ao resto da atuação da Regina Casé nesse filme lhe valeria o Oscar de melhor atriz coadjuvante. Nos resta então escutar os pedidos da empregada Regina: “tenha modos, Igor, tenha modos!".

Falando em atores globais e mais conhecidos do grande público, olha só quem faz parte do elenco: Cláudio Marzo, Anselmo Vasconcelos, Evandro Mesquita, Júlio Medaglia, ainda uma participação especialíssima de José Mojica Marins e Maria Zilda Bethlem em apenas uma cena, digamos, bem picante como você poder ver pela foto abaixo:



Com esse time e esse enredo fica impossível perder essa pérola do cinema nacional, isso sem falar do personagem principal, a múmia, que rouba a cena com seu andar meio zumbi e uma força sobrehumana. Tudo aqui é feito em medida milimétrica para arrancar gargalhadas do público. E dá certo.

O diretor Ivan Cardoso, até então só havia dirigido curtas-metragens (o primeiro deles têm um nome sugestivo: “Nosferatu in Brazil”) fez a sua estreia em longas de maneira sublime, com um filme que não tem medo de ser o que é, e tem sim uma identidade. O nome dela é “terrir”.

* Em tempo: o blog Estranhezas Cinematográficas anuncia uma parceria oficial com o Scary Blog (http://scaryblog.zip.net) para o bem do cinema fantástico. Lá vocês encontram notícias atualizadas do mundo do terror, e, a partir de agora, algumas críticas minhas voltadas para o gênero.

6 comments:

  1. No minimo, curioso. Terrir brasileiro é bem raro de se ver, ainda mais com um elenco relativamente bom. Realmente não há mais enredo a ser inventado...

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  2. Gênial,
    A cena da Regina Casé com o Igor, é escabrosa e traumatizante. É um filme engraçado.
    O cinema brasileiro mudou de foco desde os anos 80, não se vê mais filmes como "Matei Lúcio Flavio" e " O Segredo da múmia". Será uma falta de foco ou uma evolução????
    É muito instigante conhece-los ou revive-los com suas criticas, que são ricas e, cheias de ação.
    Indicação obrigatória!!!

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  3. Fernando,

    O próprio cineasta alemão Samuel Fuller falou o seguinte sobre "O Segredo da Múmia": "Uma múmia no Brasil? Isso sim é cinema". Só para ser ter uma noção da repercussão do filme fora do país na época. Ou seja, uma ideia sem noção assim merece um mínimo de atenção, você não acha?

    Camila,

    Acho que o foco mudou sim: hoje os produtores visam muito mais o lucro do que naqueles tempos primórdios, porém sempre há uma esperança e vira e mexe aparece coisa boa. O próprio cinema nacional costuma me surpreender mais que o norte-americano e dos outros grandes centros.

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  4. Hoje temos uma linda direção de arte nos filmes, mas baixa criatividade e falta de ousadia. Parece que os roteiristas são um conclave de padres e freiras franciscanas. Sugiro que o próximo enfocado no seu blog seja o Paulo César Pereio. Continue firme que esa ideia vai pegar.

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  5. voce falou tudo que ví, mais eu quero saber o nome da loira que interpreta a mulher do cientista . o nome dessa atriz por favor

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  6. poderia disponibilizar pra baixar

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